CARTA
ABERTA À SOCIEDADE
Nós, servidores do corpo técnico do
Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (INEMA), autarquia da
administração indireta do estado da Bahia, somos responsáveis pela emissão
de licenças, autorizações ambientais e outorga para o uso a água, pela fiscalização
das atividades potencialmente poluidoras, pela criação e gestão de
Unidades de Conservação, e pela gestão dos recursos hídricos, florestais e
da biodiversidade, além da fiscalização da segurança de barragens, e vimos
prestar alguns esclarecimentos à sociedade baiana.
Conscientes das suas responsabilidades
e atentos às demandas da sociedade, os servidores deste Instituto estão
empenhados em alertar a toda sociedade civil para os desmandos provocados
pela política ambiental promovida na atual gestão, ao longo dos últimos
cinco anos, e para as ações deliberadas do governo para desqualificar as estruturas
estaduais e o corpo técnico do INEMA, como pano fundo para o desmonte da gestão
ambiental e dos recursos hídricos no estado e no país.
Grande parte disso decorre da
desestruturação institucional do INEMA, que vem perdendo sua autonomia de órgão
executor da política de meio ambiente e recursos hídricos, tendo a Secretária
de Meio Ambiente usurpado suas atribuições e projetos – cometendo graves desvios
das suas competências legais. A exemplo do “confisco” legalizado do Fundo
de Meio Ambiente (FERFA) e do Fundo de Recursos Hídricos (FERHBA), cuja
transferência para a SEMA impactou severamente a autonomia do INEMA, tirando
recursos financeiros e patrimoniais importantes para a execução da
política ambiental. Ademais, a participação popular foi descaracterizada
pela pasteurização das audiências públicas e o enfraquecimento do Conselho
Estadual de Meio Ambiente (CEPRAM). As análises dos Estudos de Impactos
Ambientais foram distorcidamente simplificadas e as Comissões Técnicas de
Garantia Ambiental (CTGA) de órgãos públicos passaram a assumir o licenciamento
de empresas privadas. É grave ver “legalizada” neste Estado a
flexibilização dos instrumentos de gestão ambiental, a exemplo da isenção
de licenciamento para agricultura e pecuária extensiva, e o excesso de
autorizações para supressão de vegetação nativa que potencializa
desmatamento insustentável.
A conservação da biodiversidade e a
gestão das Unidades de Conservação - UC não tem tido prioridade na atual
agenda ambiental: há mais de 4 anos nenhuma UC foi criada na Bahia, nenhum
Plano de Manejo foi elaborado, e nenhum projeto socioambiental foi contemplado
para as comunidades no entorno das UC. Ainda mais grave, a maioria das UC
está sem gestor, apesar do concurso público realizado recentemente ter
previsto servidores para essa função, o que não foi respeitado. A situação
da gestão da biodiversidade é ainda mais grave do ponto de vista
administrativo, com alta rotatividade de diretores tecnicamente
despreparados (5 diretores em 4 anos), o que ocasionou estagnação das
ações de gestão florestal e da proteção da fauna silvestre, a exemplo da não
implantação de sequer um Centro de Triagem de Animais Silvestres (CETAS)
estadual.
A Bahia foi um dos estados pioneiro na
criação de uma Política Estadual de Recursos Hídricos após a promulgação
da Constituição Federal de 1988, com a publicação da Lei nº 6.855/1995,
que precedeu a Lei Federal 9.433/1997, a qual estabeleceu a Política
Nacional de Recursos Hídricos. Apesar desse pioneirismo, a Bahia tem
vivenciado, nos últimos anos, retrocessos na gestão de seus recursos hídricos,
com frequentes modificações na política estadual, nos últimos anos. Em
especial, as leis 12.035/2010, 12.377/2011, que alteraram a lei 11.612/2009,
mesclaram sem integrar devidamente a política de Meio Ambiente com a de
Recursos Hídricos, não atentando para suas devidas particularidades e fragilizando
os instrumentos de gestão das águas.
Essas ações de desmonte da Política
Estadual de Recursos Hídricos se iniciaram na gestão do Secretário Eugênio
Spengler, quando em 2010, as campanhas de monitoramento da qualidade das
águas da Bahia foram reduzidas de 4 para 2 por ano, além das reuniões dos
Comitês de Bacia Hidrográfica e do Conselho Estadual de Recursos Hídricos
terem sido reduzidas drasticamente. Em 2011, a extinção do Instituto de Gestão
das Águas e Clima quebrou um processo de fortalecimento do Sistema
Estadual de Gerenciamento dos Recursos Hídricos, com a pulverização da
outorga em diversos setores do INEMA, a descontinuidade do cadastro dos
usuários da água, a redução da fiscalização, assim como a extinção do
Centro de Meteorologia da Bahia - CEMBA, entre outros. Nesse período
nenhum novo Comitê de Bacia foi formado e os atuais têm suas atuações
esvaziadas. Dentre outras consequências, destacamos a fragmentação e esfacelamento
da análise e gestão das outorgas, bem como atraso nos planos de bacia e enquadramento
de corpos d’água, que poderão comprometer a disponibilidade hídrica para os
usuários e agravar a crise hídrica, já instalada. Apesar dos esforços dos
técnicos em apontar e tentar corrigir esses problemas, a direção do INEMA não
tem respondido de forma efetiva.
A falta de diálogo dessa gestão é a
marca registrada permeada por absoluta falta de respeito com os
servidores, despreparo na condução dos processos de negociação, descumprimento
de acordos, e não atendimento deliberado dos nossos pleitos o que demonstra
autoritarismo e distorção na centralidade da direção do órgão. Como exemplo: ausência
completa da participação dos servidores nas discussões do Plano Plurianual;
a ineficiência da Avaliação de Desempenho Funcional (ADF); a falta de
transparência na condução do percebimento de insalubridade e
periculosidade para os servidores que se expõem a riscos em atividades de
campo; a ausência de segurança no trabalho; falta de capacitação e
valorização do servidor; entre outras demandas que são totalmente ignoradas
pelos dirigentes, provocando uma onda de insatisfação e desânimo do
servidor para com esta gestão.
Por fim, nós, servidores do corpo
técnico do INEMA, gostaríamos de manifestar nossa indignação e informar à
população que estamos em Operação Padrão desde Abril/2015 e que, caso não
ocorram avanços das pautas reivindicadas, entraremos em paralisação.
Certos de que o meio ambiente
equilibrado é interesse e responsabilidade de todos, convocamos a
sociedade baiana para a reflexão e o apoio à nossa mobilização, tendo como
meta novos rumos para o meio ambiente e as águas da Bahia.
ASCRA –
Associação Pré-Sindical dos Servidores do Instituto do Meio Ambiente e Recursos
Hídricos
ASSERF –
Associação dos Especialistas e Fiscais do Grupo Ocupacional Fiscalização
e Regulação do Estado da Bahia
AFA –
Associação dos Fiscais Estaduais Agropecuários da Bahia
ASTEFIRBA –
Associação dos Técnicos em Fiscalização e Regulação da Bahia
Fonte: ASCRA
Gostaria de saber o que quer dizer exatamente este trecho da carta? : pauta é a flexibilização dos instrumentos de gestão ambiental como a isenção de licenciamento para agricultura e pecuária extensiva;
ResponderExcluirAntonio, boa tarde. Acredito que está fazendo menção à Resolução CEPRAM nº 4327/2013 que acaba com a obrigatoriedade de licenciamento ambiental para a agricultura e pecuária em área consolidada. Segue o link da resolução: http://www.meioambiente.ba.gov.br/upload/150514-Resolucao4327_%20Impacto%20Local%20dos%20Municipios.pdf
ExcluirMais do que isso, Antonio. A crítica é ao Decreto Estadual nº 15.682 de 19/11/2015, que em seu Anexo IV ISENTA do licenciamento ambiental as atividades de agricultura e pecuária (com exceção das criações confinadas), independente da área que ocupem ou produção. Ou seja: a partir de novembro do ano passado, um sujeito que queira iniciar um plantio de soja ou uma criação de gado, mesmo que ocupe o oeste da Bahia inteiro, não mais será exigido o licenciamento ambiental, estando somente sujeito ao registro no CEFIR, à autorização para supressão de vegetação nativa, e à outorga (se houver captação de água).
ExcluirQuer exemplos? No portal do SEIA tem alguns: no mesmo dia em que o decreto foi publicado, foi formado um processo de Autorização de Supressão de Vegetação nativa (ASV) de mais de 5 mil hectares, para criação de gado leiteiro, em Cocos (autorização concedida pela Portaria nº 9304 publicada no D.O.E de 26.02.2015). Três dias depois da publicação do mesmo decreto, foi formado outro processo de ASV, dessa vez de 3 mil hectares, para plantio de soja, em Correntina (autorização concedida pela Portaria nº 9100 publicada no D.O.E de 17.01.2015). Esses são só dois exemplos, disponíveis no portal SEIA, mas certamente existem outros.
Ficam as perguntas: o único impacto ambiental desses empreendimentos é a supressão de vegetação? O uso de agroquímicos não gera impactos que mereçam ser avaliados? E o efeito do pisoteamento do solo por mais de 5 mil cabeças de gado, não pode provocar compactação e erosão do solo? E as comunidades no entorno dessas propriedades, não têm o direito de opinar em empreendimentos de tal vulto?
Na minha opinião: ganha o agronegócio “tipo exportação”, em prejuízo do meio ambiente e da sociedade baiana.
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