Entidades denunciam manobra do governo
PPP no saneamento da Bahia é jogo de cartas marcadas para entregar o
patrimônio público a empresas privadas
É extremamente preocupante e
estranha a simpatia do governador Rui Costa pelo uso da parceria
público-privada, especialmente na área de saneamento básico, uma ação essencial
à promoção da saúde pública. Mais conhecida pela sigla PPP, essa “parceria” é
uma forma de privatização de serviços públicos que são entregues à iniciativa
privada sob o argumento infundado da falta de recursos públicos. Ao mesmo tempo
em que o patrimônio público é entregue, o governo remunera com extrema
generosidade as empresas privadas, como é o caso da Arena Fonte Nova construída
com recursos públicos e hoje operada pela iniciativa privada. Contrariando o
discurso da escassez de recursos, as empresas privadas têm sido financiadas
pelo Estado brasileiro para entrar no negócio do saneamento básico. Isso
facilita a corrupção e retira direitos conquistados pelos trabalhadores e
coletividade.
O governador está propondo uma
PPP com um discurso de que vai resolver a questão do saneamento básico de
Itabuna, que vive uma grave crise no abastecimento de água. A desculpa é de que
nem a empresa municipal, a Emasa, nem a estadual, a Embasa, têm recursos para
investir. Não é bem assim. O Plano Municipal de Saneamento Básico do referido
município prevê investimentos de R$ 350 milhões ao longo de 20 anos para
garantir abastecimento de água e esgotamento sanitário a toda população, algo
em torno de R$ 17 milhões ao ano. Ora, o faturamento anual da Emasa é de R$ 50
milhões. Já a Embasa teve faturamento de R$ 2,2 bilhões em 2014. Ele também
está propondo uma PPP para o abastecimento de água de Feira de Santana.
São elevados os investimentos
efetuados pela Embasa. Nos últimos 9 anos foram assegurados/aplicados R$ 7,6
bilhões, entre recursos próprios, do Programa de Aceleração do Crescimento
(PAC), BNDES e Caixa Econômica Federal, além de estar sendo negociado recursos
superiores a R$ 1,0 bilhão para novos investimentos. Com isso foi possível
ampliar em 35% a oferta de água, atendendo mais 5 milhões de baianos e aumentar
em 101% a rede de esgotamento sanitário, beneficiando mais 2 milhões de
baianos. Ou seja, existe dinheiro público para obras, basta buscar acesso aos
financiamentos e aos orçamentos do Estado e da União, com contrapartida dos
municípios.
Apresentar a PPP como alternativa
é pretexto para drenar grandes volumes de dinheiro para empreiteiras – muitas
delas envolvidas em esquemas de corrupção, como a Operação Lava Jato, na qual
figura a Odebrecht -, uma das interessadas em prestar tal serviço em Itabuna. É
por meio de uma PPP que a Odebrecht construiu e opera o Sistema de Disposição
Oceânica do Jaguaribe, o segundo emissário submarino construído em Salvador,
mediante contrato de 15 anos no valor de R$ 619 milhões, embora cerca de 70% da
obra tenha sido financiada com recursos do governo federal. Além disso, a
Embasa remunera essa empreiteira com R$ 5,3 milhões ao mês. Ao final do
contrato terá pago mais de um R$ 1 bilhão, valor que evidencia o grande negócio
e a capacidade do Estado em implantar e operar o empreendimento. Até porque
construiu e opera o primeiro emissário submarino da capital baiana, o do Rio
Vermelho. Estudos técnicos da própria Embasa indicam que, se a empresa
estivesse operando o emissário da Boca do Rio, o custo seria reduzido em mais
de 50% do que é pago.
É preciso lembrar que a empresa
privada tem como principal compromisso o lucro dos seus acionistas e quase
nenhum com o interesse público e ambiental. É só olhar a crise hídrica em São
Paulo provocada pela omissão da empresa estadual, a Sabesp, que abriu seu
capital para o setor privado e repassou R$ 4,5 bilhões nos últimos 10 anos aos
seus acionistas, lucro obtido com tarifas reajustadas bem acima da inflação,
além de não realizar obras fundamentais para o abastecimento de água da
população.
Para exemplificar ainda mais os
conflitos entre o público e o privado, o caso da Samarco, subsidiária da Vale
que foi privatizada na década de 90, também é emblemático. Por falta de
responsabilidade socioambiental, provocou o mais grave desastre ambiental do
Brasil, deixando romper uma de suas barragens de rejeitos, atingindo extensa
área da bacia hidrográfica do rio Doce em Minas Gerais e Espírito Santo.
O que se pretende em Itabuna é
doar uma empresa pública (a Emasa) para empresários, numa criminosa entrega de
patrimônio público (a Vale foi vendida por cerca de R$ 4 bilhões, quando seu
valor de mercado era superior a R$ 90 bilhões). Além disso, a falsa solução com
a PPP poderá significar aumentos exorbitantes de tarifas, precarização do
trabalho, queda na qualidade do serviço e demissões em massa, e quem mais vai
sofrer o ônus dessa operação meramente econômica é a população mais pobre.
No caminho oposto ao que se
pretende adotar em Itabuna, mais de 200 cidades no mundo já retomaram seus
sistemas de abastecimento de água das mãos de empresas privadas. Itália,
Uruguai, Bolívia e Argentina rejeitaram a privatização, além de Paris, em razão
dos aumentos abusivos nas tarifas, péssima qualidade nos serviços prestados,
contaminação bacteriológica da água e intermitência no abastecimento. A
população do Chile vem tentando o mesmo. O abastecimento de água em Nova Iorque
é totalmente público. A Bahia viveu uma tentativa de privatização da Embasa na
década de 90, rechaçada por mais de 70% da população.
É fato que, hoje, o empresário
não quer mais a privatização plena, com a aquisição total da empresa pública.
Prefere a PPP, pois por meio dela recebe dinheiro do Estado para investir e
assegura lucro excepcional, isso porque se o negócio der prejuízo o Estado paga
a conta, ou seja, o contribuinte.
É importante que a sociedade
baiana saiba dessas iniciativas do Governo do Estado e defenda o patrimônio
público. Por acreditar na capacidade do Estado em prover a população com
serviços públicos universais e de qualidade é que as entidades abaixo listadas
e o recém criado Observatório do Saneamento Básico da Bahia conclamam a
sociedade baiana para a defesa intransigente do saneamento básico público em
nosso estado.
Água é direito humano fundamental
e não pode ser transformada em mercadoria!
Sindicato dos Trabalhadores em
Água, Esgoto e Meio Ambiente no Estado da Bahia - SINDAE
Associação Brasileira de
Engenharia Sanitária e Ambiental/Seção Bahia - ABES/BA
Associação Nacional dos Serviços
Municipais de Saneamento – ASSEMAE
Grupo Ambientalista da Bahia –
GAMBÁ
Observatório de Saneamento Básico
da Bahia.